É comum encontrarmos no território gaúcho a presença da espécie arbórea Ceiba speciosa, também conhecida como paineira. O que poucos sabem é que a casca dessa árvore pode esconder um poderoso elemento para o tratamento de doenças gastrointestinais, como úlcera e gastrite. É o que aponta uma pesquisa realizada pelo Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia (PPGBiotec) da Univates.
O estudo teve início em 2014 a partir de uma proposta da mestranda Juliana Dorr. Na época, a estudante ainda era graduanda do curso de Farmácia e teve na família a inspiração para produzir seu trabalho de conclusão de curso. “Eu sempre gostei da área de fitoterapia, e tinha na minha família o caso de um parente que utilizava essa planta para tratar a úlcera”, explica Juliana.
Conforme explica a coordenadora do grupo de pesquisa “Biotecnologia e farmacologia de produtos naturais”, professora Márcia Goettert, o uso caseiro da planta consiste na extração da casca do caule, que posteriormente é imersa em água e levada à geladeira. “A água, no papel de solvente, tem a capacidade de extrair alguns dos compostos presentes na casca responsáveis pelo efeito”, afirma Márcia. Em busca de metodologias que permitissem avaliar esse potencial antiulcerogênico, foram também preparados diferentes extratos, como o etanólico, o aquoso e o etnofarmacológico (caseiro).
Segundo a pesquisadora, um dos extratos, preparado de forma diferente do modelo etnofarmacológico, tem apresentado resultados ainda melhores. Para investigar o efeito mencionado pela população local que faz uso da planta, o grupo de pesquisa vem realizando diferentes análises por meio de atividades in vitro (com células humanas) e in vivo (com ratos e camundongos) para auxiliar na elucidação do mecanismo envolvido.
“Para a nossa surpresa, um dos extratos preparados com a planta reverteu a situação (úlcera induzida). O animal tratado com o extrato da planta teve uma resposta positiva comparável com os animais que foram tratados com omeprazol, um medicamento utilizado para o tratamento de gastrite e úlcera”, conta a coordenadora. Durante o segundo semestre de 2017 Juliana permaneceu por 15 dias desenvolvendo pesquisas com um grupo parceiro, no laboratório de farmacologia da Universidade de Vila Velha, e realizando experimentos adicionais para confirmar e complementar os resultados já encontrados.
Para os próximos passos a pesquisadora garante que é necessário confirmar esse potencial, além de identificar quais fitoconstituintes presentes são responsáveis pelo efeito benéfico, ou seja, qual o mecanismo farmacológico. Posteriormente, se confirmados os resultados, os dados poderão ser repassados a uma indústria farmacêutica. “Temos grandes perspectivas de desenvolver algum produto, um fitoterápico ou até algum fármaco inovador oriundo dessa planta”, conclui Márcia.
Crescimento no uso de fitoterápicos
O uso de medicamentos oriundos de produtos naturais tem crescido consideravelmente no mundo, conta Márcia. No Brasil, diversas plantas são utilizadas pela população, mesmo sem estudos científicos. Atualmente, das 71 plantas que fazem parte da Relação nacional de plantas medicinais de interesse ao Sistema Único de Saúde (Renisus), 12 delas já são distribuídas pelo próprio SUS. “Os fitoterápicos muitas vezes apresentam menos efeitos colaterais do que os medicamentos sintéticos”, diz Márcia.
Patente já depositada
Em 2015, a Universidade entrou com pedido de patente para a utilização da planta medicinal. A concessão foi outorgada em 2016, junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi).