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Geólogo paulista avalia situação de morros e encostas junto às comunidades

Também houve deslizamento de terra na Linha Gamela, em Teutônia / Crédito: Divulgação

Pela segunda vez em oito meses, uma equipe da Defesa Civil de São Paulo se deslocou ao Vale do Taquari para auxiliar no atendimento e orientação dos municípios afetados pela grande quantidade de chuva e enchentes que assolaram a região na semana passada. Desta vez, veio também o geólogo Marcelo Gramani, pesquisador do Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo, que há mais de 22 anos realiza trabalhos preventivos junto aos bombeiros e defesas civis, capacitando a população e mapeando áreas de risco de deslizamentos e enxurradas.

Geólogo Marcelo Fischer Gramani, da Defesa Civil de Gramado / Crédito: Lucas Leandro Brune

Isso porquê, na região, foram constatados inúmeros casos de deslizamentos, escorregamento ou rastejo de massas. De fato, Gramani trabalha junto às comunidades de diversos municípios desde o fim de semana, tendo visitado Teutônia, Westfália, Poço das Antas, Roca Sales e Colinas. As visitas envolvem análises técnicas em morros, reconhecimento de pontos críticos e orientação das comunidades.

Dentre os mais de 20 locais identificados com movimento de massa – como em Linha Gamela, Linha Harmonia Alta e Fundos, Linha Schmidt Fundos, Paissandu, Bairro Daltro Filho, o mais emblemático envolve a Serrinha, que faz divisa entre os municípios de Imigrante, Colinas e Roca Sales. Neste local, cinco pessoas da mesma família foram soterradas e morreram abraçadas.

Processos de movimento de massa, escorregamento ou rastejo foi o que o geólogo mais viu na região. Nos três primeiros municípios, no entanto, não se viu sinal claro de que as massas estavam descendo. “A conversa com as comunidades é justamente para que eles não duvidem que uma encosta ou barranco bem vegetado, por exemplo, não venha a descer. O escorregamento é rápido, acontece à noite e pega as pessoas desprevenidas”, alerta.

Muitas cidades registraram mais de 800 milímetros de chuva em poucos dias. Esse número preocupa muito pelo rastejo, que é movimentação lenta de terras. “Vimos muitas fraturas e rachaduras, o que chamamos de degraus. Na verdade, é a sinalização de que a massa toda já rompeu e está por descer. Mas, em função da topografia, o material mexeu e se estabilizou”, conta Gramani. Ele orienta que, mesmo com os dias de sol, não há garantias de que a massa não se mova mais, tendo em vista que o solo está muito encharcado. Sinal disso é a água escoando fortemente nos pés dos barrancos.

Aponta o trabalho conjunto através do conhecimento da comunidade local sobre os terrenos. “A partir das conversas, conseguimos definir ações que os moradores e técnicos das prefeituras podem realizar para antecipar problemas.”

Quem ocupa margem de rio e morro sempre estará sujeito a risco. Mas ele tem momento certo para acontecer. Segundo Gramani, os movimentos de massa estão associados, no Brasil, às chuvas intensas e concentradas. O trabalho preventivo envolve dois grandes focos: onde e quando irão acontecer as movimentações. As situações mais perigosas envolvem locais com córregos e morros. Quanto mais residências próximas dessas saídas ou vales, mais perigoso, tendo em vista o transporte de sedimentos pela água. “Grande concentração de água em pouco tempo provoca enxurrada. Movimentos de massa se transformam em avalanche”, explica.

Geólogo orientou famílias e autoridades sobre rachaduras e áreas de risco nas encostas / Crédito: Marcos Guarani

Prevenção

Gramani sugere aos municípios, além da evacuação imediata, como ocorreu nos municípios da região, a atualização de mapas de risco, bem como criação de mapas de suscetibilidade para cada área de cada município. “Quando fizermos mapas topográficos, várias áreas serão restringidas e limitadas.”

Mas o problema, segundo ele, é o respeito com as questões técnicas e a falta de confiança na ciência. “Respeitamos profissionais da Medicina, do Direito, da Engenharia. Por que não aqueles que trabalham com a natureza? Muito tempo atrás tomamos decisões sem respeitá-la, e agora ela se apresenta. Movimentação de terra é o processo que mais mata as pessoas no país”, diz, citando exemplos como Petrópolis, São Paulo e no Complexo do Baú, em Santa Catarina (2008), com deslizamentos induzidos pelo crescimento populacional.

“Isso falando em população. Em algum momento esquecemos da infraestrutura, que é altamente vulnerável ao risco. Nossas rodovias, ferrovias, dutovias estão todas sujeitas ao mesmo risco, bem como pontes, que hoje são nosso maior problema aqui”, comenta.

Para ele, não basta ter conhecimento dos mapas, mas sim é preciso dar conhecimento à população. “Para ter sirene de alerta, todo mundo tem que saber por que ela tá tocando, para onde ir e o que fazer. Não é só a sirene, tem que estar atrelada a treinamentos tanto da população como das equipes”, alerta Gramani. É capacitar as pessoas no agir, em sair de casa quando for alertado, em ter mala pronta com documentos e remédios separados.

Segundo ele, não só o estado mas todo o país aprenderá muito com essa situação. “E se não aprender deixará a oportunidade passar”, completa.

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