O 8º seminário interiorano do Fórum Democrático da Assembleia Legislativa do RS (ALRS) debateu, nesta segunda-feira (8/9), os caminhos para um crescimento sustentável nas regiões do Vale do Taquari e do Vale do Rio Pardo. O evento, realizado no auditório do Prédio 7 da Univates, das 8h30 às 12h, reuniu autoridades políticas, empresariais, pesquisadores, lideranças sindicais e representantes de movimentos populares.
Sob o lema “Pacto RS 25 – O crescimento sustentável é agora”, o presidente da ALRS, deputado Pepe Vargas (PT), abriu os debates destacando a necessidade urgente de ações de mitigação além da adaptação, após as severas enchentes de 2023 e 2024. “É fundamental um diagnóstico preciso das bacias hidrográficas. As águas do planalto descem de forma avassaladora para os vales”, afirmou, citando estudos sobre a compactação do solo na Serra Gaúcha, que impermeabiliza a terra e agrava as enchentes. Ele defendeu programas de manejo e descompactação do solo e recuperação das matas ciliares com espécies nativas, transformando esses desafios em oportunidades de negócio, emprego e renda através da transição energética.
Da Discussão à Ação: Convite para Congresso de Ciências Médicas
Um dos desdobramentos práticos anunciados durante o seminário foi a convocação para o Congresso de Ciências Médicas da Univates, marcado para os dias 20 e 21 de outubro. O evento, que nasceu de discussões anteriores promovidas pelo Fórum, terá como tema central o impacto do meio ambiente na saúde. O objetivo é desenvolver estratégias de planejamento para que a região esteja melhor organizada para enfrentar novos eventos climáticos extremos, que se consideram inevitáveis.
“A gente tem certeza que esse ano deve dar mais uma cheia do Taquari… e a gente precisa ter um mínimo de organização possível”, declarou o representante do curso de Medicina, convidando todos os municípios presentes a enviarem representantes da área da saúde. O congresso vai abordar desde a organização dos pontos de vista ambulatorial e hospitalar até o tratamento das “doenças invisíveis” – problemas de saúde silenciosos agravados pela agressão ambiental e pelo trauma dos desastres.
A Crise Humanitária Invisível
A urgência do tema foi ilustrada com um relato impactante sobre as consequências humanas das enchentes. Foi citado o caso de uma família no município de Cruzeiro do Sul que, mesmo em uma área considerada alta, passou 28 horas em cima de uma mesa dentro de casa, com medo de ser arrastada pela água que subia. A história evidencia que a vulnerabilidade atinge uma ampla parcela da população, mas recai com mais força sobre os mais pobres e agricultores, que não têm recursos para prevenção ou realocação.
Foi destacada a necessidade urgente de realocar moradores de zonas de risco repetitivo. “Essas pessoas não têm mais como voltar para um local que elas provalvemente vão sofrer o mesmo problema logo adiante… Vão acabar voltando para lá e vão acabar de novo sofrendo a mesma situação”, alertou uma participante, reforçando que muitos municípios da região enfrentam esse dilema.
Painéis e Propostas Concretas
O público conheceu a Plataforma Digital de Participação Popular Pacto RS 25 (acessível em @pactors25.gov), onde qualquer cidadão pode sugerir e apoiar propostas para o desenvolvimento do estado. Ronaldo Zulke, coordenador do Fórum, e o assessor Tarson Nuñez explicaram o funcionamento do site, que já conta com mais de 90 propostas cadastradas e possui mecanismos para combater fake news e evitar o sequestro de demandas por grupos econômicos.
Os painéis técnicos trouxeram profundidade ao debate. O professor Markus Erwin Brose (Unisc) enfatizou a força das estruturas coletivas da agricultura familiar e das universidades comunitárias da região como bases para a transição. Já o professor Odorico Konrad (Univates) apresentou um laboratório móvel de biogás montado em uma Kombi, ilustrando o conceito de economia circular. Ele defendeu a integração entre produção, inovação tecnológica e a redução da pegada de carbono, aproveitando o potencial associativo da região. “Temos potencial para salvar o planeta e ampliar a qualidade de vida da nossa população. O sol brilha para os vales”, argumentou.
Mercado de Trabalho e Desafios Sociais
No painel “Crescimento Sustentável e a Reinvenção do Trabalho”, Gilberto Piccini, diretor da Fiergs e presidente da Dália Alimentos, alertou para o apagão de mão de obra. Dados apresentados por ele mostram que 75% dos empregadores têm dificuldade para preencher vagas, um problema agravado pela alta informalidade (38,5%), envelhecimento populacional e êxodo de gaúchos – cerca de 700 mil deixaram o RS entre 2000 e 2022.
Marco Daniel Rockenbach, presidente do Sindicato dos Comerciários de Lajeado, complementou com um recorte local preocupante: a concentração de renda no Vale do Taquari é maior que a média estadual, enquanto a média salarial é menor. “A média salarial não acompanha o crescimento da região. Os recursos não são repassados aos trabalhadores”, disse, citando que a remuneração média em Lajeado é de R$ 1.800 para 55% da categoria. Ele atribuiu a alta rotatividade (turnover) a salários inadequados e condições de trabalho ruins, que ele classificou como “medievais”, defendendo a redução da jornada para 40 horas semanais e a adoção de escalas mais humanizadas, como 5×2.
Caminhos para a Reconstrução
Em coletiva, Pepe Vargas reforçou que o objetivo do Fórum é produzir um documento final para subsidiar governos e a própria ALRS, unindo o crescimento econômico à sustentabilidade social e ambiental. Ele também se posicionou criticamente sobre a proposta de concessão de rodovias, considerando as tarifas de pedágio projetadas “muito caras para a sociedade suportar”.
O evento contou com abertura cultural da Orquestra Gustavo Adolfo da Univates e mediação da jornalista Giane Guerra. Estiveram presentes na mesa de abertura a reitora da Univates, Evânia Schneider; o secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Jairo Valandro; a presidente da Câmara de Vereadores de Lajeado, Ana Rita Azambuja Silva; e os presidentes dos Corede Vale do Taquari e Vale do Rio Pardo, Cíntia Agostini e Heitor Álvaro Petry, respectivamente. O Fórum Democrático segue percorrendo as nove regiões funcionais do estado e já reuniu cerca de 4 mil pessoas em seus debates.