
A Câmara de Comércio, Indústria, Serviços e Agronegócio de Estrela (Cacis) promoveu, nesta sexta-feira (18/7), a quarta edição do ano da sua reunião-almoço. O encontro reuniu lideranças empresariais da região para abordar a governança na China e os aprendizados possíveis para o ambiente corporativo brasileiro.
A palestra foi conduzida pelo conselheiro de Administração e diretor-geral do Grupo Medical San, Fernando Röhsig. Ele compartilhou suas impressões após uma recente missão técnica ao país asiático, realizada por meio do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).
Com sólida experiência em negociações internacionais e frequente interlocução com mercados dos Estados Unidos, Europa e Ásia, Röhsig apresentou a sua perspectiva sobre os mecanismos que fazem da China uma potência econômica mundial.
Durante o encontro, o executivo abordou o funcionamento do sistema chinês, que mescla um regime político comunista com práticas de mercado típicas do capitalismo. Segundo ele, a China opera como duas economias em paralelo, sendo uma voltada ao consumo interno, com mais de 1,4 bilhão de habitantes, e outra direcionada ao comércio global. “Cada uma funciona com dinâmicas e estratégias próprias”, afirma.
A apresentação incluiu relatos de visitas técnicas a empresas, órgãos reguladores, institutos de pesquisa e hubs de inovação. “Tivemos acesso a experiências e informações valiosas, muitas das quais são pouco conhecidas fora da China”, destaca. Segundo ele, o objetivo da visita foi provocar reflexões sobre como essas práticas podem inspirar melhorias e adaptações nos modelos de gestão e inovação das empresas locais.
“Brasil e China não estão alinhados no regime político, e isso importa na hora de fazer negócios”

Folha Popular – Qual a importância de estar atento ao crescimento da China no mercado global?
Fernando Röhsig – A China é a segunda maior população do mundo e a segunda maior economia mundial em termos de PIB. É um mercado consumidor de 900 milhões de pessoas e o maior parceiro comercial do Brasil.
Folha Popular – Quais os riscos e oportunidades da ascensão chinesa para as nossas empresas da região?
Röhsig – O relacionamento com empresas chinesas sempre tem uma grande oportunidade, pois, pelo tamanho do mercado chinês, essas empresas conseguem obter custos muito competitivos nas suas ofertas. Porém, concorrer é muito difícil quando ambas empresas, as daqui e as chinesas, estão no mesmo lado da oferta. A ascensão chinesa com produtos cada vez mais qualificados impõe condições que podem comprometer empresas na região. Por outro lado, empresas daqui podem ofertar produtos na área da alimentação com valor agregado para competir naquele mercado, que é muito grande em termos de volume, mas baixo em renda per capita.
Folha Popular – Diante das ameaças de tarifas do mercado norte-americano, aumenta a importância da China para os exportadores brasileiros?
Röhsig – No curto prazo, é muito difícil abrir mercados para produtos perecíveis, como é o caso de parte importante do que exportamos para o mercado norte-americano (carnes e sucos, por exemplo). Já produtos não perecíveis precisam ser competitivos naquele mercado para se tornarem atraentes. Esse cenário é bastante desafiador para o Brasil.
Folha Popular – O regime político/ideológico da China e dos Estados Unidos realmente importa na hora de fazer negócios?
Röhsig – Importa muito. O aspecto cultural e o regime econômico e político precisam estar alinhados. As grandes empresas chinesas possuem membros do partido comunista em seus quadros diretivos, algo com que não estamos acostumados. Um regime político comunista num regime econômico capitalista. Brasil e China não estão alinhados no regime político e isso importa na hora de fazer negócios. Em todo caso, entendo que precisamos manter e crescer na oferta ao mercado chinês, mantendo a independência. O ponto é que os EUA, país dominante, está demonstrando que não quer que o Brasil e outros países reforcem as relações com a China.
Folha Popular – De que forma esse posicionamento nos afeta?
Röhsig – Esse aspecto pode nos atrapalhar muito a partir de manifestações do governo brasileiro. Se tivéssemos mantido a independência, sem nos manifestarmos em assuntos nos quais não podemos liderar ou em que somos irrelevantes no cenário mundial. Por exemplo, uma moeda digital liderada pela China envolvendo os Brics. Sem isso, jamais haveria uma tarifa de 50% para as exportações do Brasil para os EUA. “A boca fala, a boca pune”. Agora é trabalhar para reverter o que está posto.