Linha Frank e o legado da fé luterana

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A igreja foi fundada há 150 anos e hoje comemora 137 anos de inauguração / Crédito: Júlia Amaral

Ao longo da vida, Elio Dahmer, de 84 anos, teve uma mesma paisagem da janela de casa: a igreja da Comunidade Evangélica Sião, em Linha Frank. O templo religioso foi inaugurado em 30 de outubro de 1887, há 137 anos, sendo uma das primeiras igrejas evangélicas do país. Além da beleza da estrutura e do movimento dos cultos, Dahmer recorda também uma figura que aparecia frequentemente por lá: Ernesto Geisel.

Foi nessa igreja que o ex-presidente do Brasil se casou e registrou o batizado. “Na verdade, ele foi batizado em Bento Gonçalves, mas só porque não conseguiram chegar até aqui. O pastor que realizou o batismo lá acabou registrando-o aqui, nesta igreja. Depois eu o via sempre… Trazia um buquê de flores para o túmulo do avô”, conta Dahmer.

O cemitério ao lado da igreja preserva memórias e a identidade de uma comunidade. Desde a fundação, a construção passou por reformas e hoje exibe um revestimento em pedra de areia. O local simboliza também a identidade de um povo, já que a análise da religião era uma orientação importante para muitos imigrantes ao escolherem onde recomeçar suas vidas.

Entre as primeiras no Brasil

A torre da igreja também simboliza a força de uma comunidade que enfrentava as leis de um país desconhecido. Quando foi erguida, havia apenas duas igrejas luteranas no Brasil com torres, já que apenas templos católicos podiam tê-las. “Era permitido apenas uma casa para reuniões. Nossa comunidade se reunia no prédio de uma escola. Foi o pastor Beckmann quem deu início ao trabalho de construção da igreja”, recorda Dahmer.

Elio Dahmer é vizinho da igreja e acompanha a movimentação da comunidade / Crédito: Júlia Amaral

Boa parte das lembranças de Dahmer estão no livro “Imigração Alemã: por que os alemães colonizaram o Sul do Brasil? Uma história da colônia Teutônia, Linha Frank e Linha Schmidt. Conforme a obra, a comunidade religiosa em Linha Frank foi fundada em 8 de junho de 1874, sob o nome Ewangelische Zions Gemeinde, ou “Comunidade Evangélica Sião”. Em seguida, iniciou-se a compra de terreno para a construção da igreja.

Muitos fiéis contribuíram gratuitamente para a obra. Após 21 dias, começaram as remunerações. A primeira foi registrada em 9 de maio, data gravada na porta da igreja com a mensagem: “Menschen Sammelt in der Seit, Schätze für die Ewigkeit” (“Homens, não percam tempo, acumulem bens para a eternidade”).

A igreja no centro e a importância da religião

Além das memórias de Dahmer e da comunidade, a construção feita pela mão comunitária simboliza a força do luteranismo. O professor de História da Univates, Mateus Dalmáz, destaca que a religião teve um papel essencial na história alemã, a partir da tradução da Bíblia por Martinho Lutero, figura central da Reforma Protestante. Esse impacto foi percebido também pelos imigrantes na América Latina.

Compartilhar a mesma religião, de origem alemã, reforçava a identidade desse povo. “O culto luterano, a maneira como ele propõe a relação com o cristianismo, é um ponto importante de identidade, pois preserva valores comuns. A visão de mundo promovida pela igreja luterana une o grupo, cria identidade e fortalece uma espécie de moral”, explica Dalmáz.

Segundo ele, esses valores ainda se mantêm, coexistindo com outros surgidos na modernidade. “O antigo e o novo convivem de maneira que, embora aparentemente contraditória, faça sentido para a comunidade, que lida com uma diversidade de valores, informações e experiências. A religião ainda serve como um elo de identidade regional”, conclui.

Comunidade ativa

Embora pequena, a comunidade é ativa e participativa. Em 2024, quando se comemora 150 anos da fundação da igreja, o engajamento é notável. “No Kerb, comemorado no fim de semana passado, praticamente todos os membros ajudaram, organizaram e participaram da festa para acolher bem os visitantes. É uma comunidade ativa em todos os setores”, afirma o pastor Valmir Frank.

Atualmente, além dos cultos, a comunidade conta com a Ordem Auxiliadora de Senhoras Evangélicas (Oase), o coral da Oase e outras festividades. Para o pastor, a tradição alemã se mantém forte, junto com a receptividade aos novos moradores que chegam à localidade.

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