Auditores-fiscais do Trabalho resgatam atletas em situação análoga à de escravo em Teutônia

Associação não tinha a mínima estrutura para formação dos atletas

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Artes
Crédito da arte: Júlia Caroline Geib / Divulgação

Os auditores-fiscais do Trabalho, da Gerência Regional do Trabalho e Emprego de Lajeado (GRTE/RS), realizaram, na quarta-feira (14/12), uma ação no município de Teutônia (RS), juntamente com o Ministério Público do Trabalho, a Vigilância em Saúde do Trabalhador e o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), do município de Teutônia, e resgataram sete atletas jovens e adolescentes submetidos a condições análogas de escravidão.  

Foi constatado que os jovens e adolescentes de outros estados (Pará, Minas Gerais e Santa Catarina) eram aliciados por captadores, conhecidos como “olheiros”, em processos seletivos, competições ou por meio de redes sociais, que prometiam oportunidade de formação e profissionalização em clube de futebol no interior do Estado do Rio Grande do Sul, além de alojamento, alimentação, estrutura para treinos e, ainda, a colocação em outros clubes de futebol expressivos.   

Na origem, os atletas efetuavam o pagamento de taxa de inscrição, parte destinada ao captador e parte destinada ao suposto clube no município de Teutônia. Além disso, arcavam com os custos do deslocamento e com quantia mensal de R$ 700,00 pelo alojamento, treinamento e pela alimentação. Os maiores de 18 anos que não possuíssem condições financeiras de custear os valores cobrados eram encaminhados para vaga de trabalho em fábrica de calçados ou frigorífico da região.   

Os atletas, que tinham idades entre 15 e 23 anos, eram provenientes de famílias humildes, tendo visto na proposta a possibilidade de realizar o sonho da profissionalização no futebol. A realidade, todavia, era outra: o suposto clube, na verdade, era uma associação recém-criada sem a mínima estrutura e sem profissionais especializados para formação dos atletas.  

Os treinos eram realizados em pracinhas e campos públicos, os treinadores não possuíam formação adequada e não havia material esportivo de qualidade. A alimentação fornecida era inadequada ao desenvolvimento sadio de adolescentes e atletas em formação. A limpeza do alojamento era realizada pelos próprios atletas, e, por diversas vezes, o jantar foi preparado por um dos adolescentes. Os jogadores arcavam, ainda, com os custos das inscrições em campeonatos e deslocamento para jogos.

Não era ofertado acompanhamento médico e odontológico e sequer havia avaliação médica prévia. Quando o atleta se machucava, tinha que pagar com os custos do tratamento para sua recuperação. Os treinos eram pouco efetivos, principalmente para aqueles que desenvolviam jornadas de trabalho de 44 horas semanais em outras atividades.

A esse quadro somou-se a contratação de pessoa suspeita de crimes de estelionato, roubo e assédio sexual, com ampla divulgação na internet, e sempre envolvendo jovens e adolescentes que sonhavam com a profissionalização no futebol. O suspeito foi contratado para captar atletas, administrar o alojamento, que na época contava com cerca de 22 jovens e adolescentes, muitos deles com idades entre 13 e 16 anos, e treinar o time que compunha a categoria sub-17. O comportamento do suposto treinador chamava a atenção dos demais, como, por exemplo, pelo fato de inscrever atletas em campeonatos nas categorias sub-17 e sub-20 com idades superiores àquelas permitidas, valendo-se de documentos de identidade falsificados.  

Em 24 de novembro de 2022, a força-tarefa culminou na interdição da cozinha do alojamento, em face das inadequadas condições encontradas, entre eles, alimentos estragados, bem como no abrigamento dos menores de 18 (dezoito) anos, conforme pedido formulado pela Promotoria de Justiça de Teutônia e determinação da Juíza da 2ª Vara Judicial de Teutônia. Três adolescentes foram para um abrigo do município, e os demais permaneceram no alojamento sem condições financeiras de retornar aos locais de origem, quais sejam, cidades do interior do Rio Grande do Sul, e os estados do Pará e Minas Gerais.  

A auditoria-fiscal do Trabalho entendeu que os jovens e adolescentes foram vítimas do tráfico de pessoas e das condições degradantes de trabalho, indicadores da condição análoga à de escravo e que significavam graves violações aos direitos humanos.

O suposto clube se valia da vulnerabilidade econômica e social desses atletas e de suas famílias, e lançava mão de práticas enganosas com vistas à exploração dos atletas em formação, não cumprindo os requisitos mínimos previstos na Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, conhecida por “Lei Pelé”, para contratar, manter em alojamento e formar atletas para o futebol, o que significa fraude à condição de atleta em formação.   

A associação foi notificada a efetuar o pagamento das verbas rescisórias e a devolver os valores cobrados de forma indevida dos atletas, o que representou R$ 38.728,95. Os jovens e adolescentes receberão três parcelas do Seguro-Desemprego do Trabalhador Resgatado, além do custeio da viagem de retorno a seus locais de origem. Cumpre registrar que, por interveniência do Ministério Público do Trabalho, quatro passagens aéreas de retorno dos atletas para os estados de Minas Gerais e Pará estão sendo custeadas pelas Federação Gaúcha de Futebol. 

Denúncias 

Denúncias de trabalho escravo podem ser feitas, de forma remota e sigilosa, no Sistema Ipê (https://ipe.sit.trabalho.gov.br/). Denúncias de trabalho infantil, no Sistema Ipê Trabalho Infantil (https://ipetrabalhoinfantil.trabalho.gov.br). 

As queixas podem ser feitas também pelo https://denuncia.sit.trabalho.gov.br/home, Sistema de Denúncias DETRAE/SIT, Ministério Público do Trabalho, ou disque 100. 

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1 COMENTÁRIO

  1. Parabéns aos órgãos envolvidos, essa é uma realidade perversa e inaceitável. Trabalho de adolescentes e adultos devem ser dignos.

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