Taxa de suicídio entre idosos cresce e prevenção é o melhor caminho

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Duas datas importantes e consecutivas no calendário: o Setembro Amarelo, mês de prevenção ao suicídio, e o Dia Internacional do Idoso, comemorado em 1º de outubro. Essas datas oportunizam a reflexão sobre a situação do idoso na sociedade e o crescente índice de antecipação do fim da vida nessa população.

Dados do Ministério da Saúde divulgados em 2018, apontam para a alta taxa de suicídio entre idosos com mais de 70 anos. Nessa faixa etária, foi registrada a taxa média de 8,9 mortes por 100 mil nos últimos seis anos. A taxa média nacional é 5,5 por 100 mil. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam, ainda, que a população brasileira com 60 anos de idade ou mais cresceu 18,8% entre 2012 a 2017. A mudança no perfil epidemiológico do envelhecimento no Brasil está produzindo demandas que requerem respostas das políticas sociais e implicam em ações de enfrentamento dos problemas sociais e de saúde que afetam essa população.

A psicóloga Claudia Weyne Cruz, especialista em saúde da Escola de Saúde Pública (ESP/RS), e com doutorado sobre o tema “suicídio de idosos em municípios do Rio Grande do Sul”, avalia que nesta fase da vida a pessoa acumula perdas próprias da idade, entre elas, do cônjuge, do vínculo com o trabalho e de amigos. “Muitas vezes o desejo de antecipar o fim está associado também à perda de saúde, de autonomia e de papéis sociais”.

A especialista explica que o comportamento suicida é resultado da interação de diversos fatores e que, por vezes, os idosos manifestam a intenção suicida, de forma indireta, por meio de verbalizações: “estão todos bem e não precisam mais de mim”; “não quero incomodar ninguém, já vivi demais”; “meu último compromisso era ver meu filho encaminhado”, “estou cansado de viver”. A comunicação verbal pode estar acompanhada de mudanças repentinas de comportamento, como desinteresse por atividades antes consideradas prazerosas, descuido com a alimentação, medicamentos e aparência, desejo súbito de distribuir pertences, bens, patrimônio e herança.

“Esses sinais muitas vezes são uma forma de despedida silenciosa da vida e não devem ser negligenciados por familiares, amigos e profissionais de saúde”. A Organização Mundial da Saúde (OMS) calcula que, para cada suicídio consumado, há cerca de vinte pessoas que o tentam. Entre idosos, a razão entre tentativas e suicídios efetivados chega a ser de aproximadamente dois para um. Isso demonstra que os mais velhos são menos ambivalentes em relação a morte, ou seja, tem menos dúvidas em relação à antecipação do fim. Claudia ressalta que as doenças incapacitantes, a dor física, as dificuldades de acesso à saúde, a falta de recursos financeiros, a solidão, o abandono e outras tantas violências praticadas contra os idosos podem levá-los a desejar a própria morte.

Com relação ao risco de suicídio nessa população, os profissionais de saúde precisam estar atentos aos sinais de alerta. É difícil para o idoso manifestar verbalmente o seu sofrimento, que acaba encoberto por queixas indeterminadas, motivo pelo qual busca com frequência o atendimento de saúde. “Em geral, esse usuário chega ao serviço de saúde alegando sintomas vagos ou uma dor difusa, um aperto no peito. Se o vínculo com a pessoa que o está atendendo for estabelecido, ele poderá confidenciar que ‘está pensando em fazer uma bobagem’. Por isso, precisamos acolher essas queixas, oferecer uma escuta qualificada, sem nenhum julgamento moral, e ajudar o idoso a falar dos seus sentimentos”.

A psicóloga destaca a importância de o profissional avaliar o grau de risco para o comportamento suicida, e tomar as medidas de proteção necessárias e encaminhamentos indicados dentro da rede de atenção à saúde, integrados com uma rede intersetorial que inclua assistência social, associações de bairro, centros de convivência, entre outros. O usuário deve ser acompanhado pelas equipes de saúde na atenção básica, mesmo que necessite de cuidados especializados em saúde mental. Cita ainda a importância de construir com o idoso o “plano terapêutico singular”, que considere a sua história de vida, lembrando que as responsabilidades pelo tratamento precisam ser compartilhadas entre usuários, familiares, profissionais e comunidade em geral.

“Nesse processo, é preciso ouvir o usuário, entender sua história e resgatar projetos que ficaram relegados, retomar atividades que, em algum momento, foram fonte de alegria e de prazer para esse idoso. Temos que ajudá-lo a construir um novo sentido, significado e direção para sua vida”. Claudia argumenta que a sociedade necessita rever seus conceitos sobre o envelhecer. “Culturalmente, precisamos superar a visão que considera o idoso um estorvo e o relega ao isolamento social. É importante valorizar a sabedoria e a experiência das pessoas mais velhas, promovendo um envelhecimento ativo, digno, com reconhecimento social e familiar”, conclui.

Prevenção

Desde junho de 2011, as tentativas de suicídio se tornaram agravos de notificação compulsória e, desde 2014, de notificação imediata nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território nacional. O que indica a necessidade de acionamento imediato da rede de atenção e proteção para a adoção de medidas adequadas a cada caso.


A sensibilização dos profissionais de saúde que atuam na rede de assistência é importante para ampliar e qualificar as notificações. Neste ano, o Programa Estadual de Vigilância da Violência Interpessoal e Autoprovocada completa 10 anos. Nesse período, foram realizadas capacitações permanentes em todas as regiões do Estado para trabalhadores e gestores das redes de saúde e intersetorial. Em 2019, o Comitê Estadual de Promoção da Vida e Prevenção do Suicídio do RS, durante a programação alusiva ao Setembro Amarelo, possibilitou que mais de quatro mil profissionais de diversas áreas participassem de seminários e eventos de sensibilização para o tema da prevenção do suicídio no Rio Grande do Sul.


Onde buscar ajuda para prevenir o suicídio?

  • Unidades Básicas de Saúde (Saúde da Família, Postos e Centros de Saúde).
  • UPA 24H, Samu 192, Pronto Socorro, Hospitais.
  • Centros de Apoio Psicossocial (Caps), uma iniciativa do SUS. De acordo com dados do Ministério da
  • Saúde, onde existe esse serviço o risco de suicídio reduz em até 14%.
  • Centro de Valorização da Vida – 188 (ligação gratuita).

Fatores de risco para idosos

  • Transtorno mental – Depressão (não diagnosticado)
  • Perda de pessoas significativas e referências sociais;
  • Vivência de solidão, acompanhada de dificuldades materiais;
  • Doenças crônicas e degenerativas (perda de autonomia);
  • Receio de ser um estorvo para a família;
  • Conflitos familiares e situações de violência, etc.

Fatores de proteção

  • Espiritualidade/fé;
  • Conectividade social e participação na vida comunitária;
  • Suporte emocional por parte de familiares;
  • Acesso à saúde
  • Acolhimento (escuta) nos serviços de saúde;
  • Reconfiguração de projetos pessoais, etc.
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